Protocolo para Investigação do Hálito

  Artigo, 18 de Dez de 2012

A intenção desse protocolo é avaliar as principais causas da halitose com relação à sua freqüência e importância, fornecer um raciocínio lógico para que os profissionais da área da saúde que se deparem com pacientes com queixa de halitose saibam como conduzi-lo e minimizar custos, evitando exames desnecessários. Deve-se manter sempre uma organização do conhecimento lógico para evitar falhas no diagnóstico, e submeter o paciente a testes invasivos e caros desnecessariamente.

Inicialmente, o clínico geral deve ter em mente que a queixa de halitose é comum entre a população geral. No entanto, muitos pacientes confundem as diferenças entre halitose verdadeira e a sensação de "boca amarga". Alguns pacientes procuram por tratamento devido à reclamação de parentes, amigos, e outros, por conta própria. O nível de confiabilidade da informação dada por amigos, parentes deve ser considerado. Na nossa experiência, alguns casos foram mal conduzidos devido às informações tendenciosas de parceiros dos pacientes. Além disso, existe a halitose fisiológica, a qual pode ser interpretada como doença, quando, na realidade, é normal. A halitose que a grande maioria das pessoas sente ao acordar é considerada halitose fisiológica, uma vez que desaparece após o ato de comer e escovar os dentes. Ela é considerada fisiológica por causa da diminuição do fluxo salivar e do aumento do processo de degradação dos restos celulares descamados na boca durante o período do sono, além do longo período de jejum que se dá durante a noite. Se essa halitose persistir após acordar, comer e escovar os dentes são necessárias mais investigações.

Algumas pessoas com queixa de halitose não a possuem verdadeiramente. É a chamada halitose fictícia, também conhecida como halitofobia, é uma halitose imaginária. Esses pacientes, quando são submetidos ao exame físico, teste organoléptico, halitometria de CSV com o halímetro, geralmente, apresentam resultados normais. É, na realidade, um problema psicológico, que também pode estar associado à Síndrome da Referência Olfatória. A Síndrome de Referência Olfatória(SRO), é uma doença psicológica complexa relacionada à alteração da consciência corporal que leva ao isolamento social, necessitando de tratamento específico. Esses pacientes devem ser encaminhados para avaliação psicológica. Não há razões para maiores investigações, se essa halitose for um sintoma psicológico, pois, consequentemente, tratamentos convencionais serão ineficazes.

Por isso, é muito importante a realização de uma boa anamnese, com histórico médico e odontológico o mais completo possível e a realização de teste objetivo em todos os pacientes com queixa de halitose. Na nossa experiência, a halitometria de CSV é a mais utilizada, uma vez que fornece um índice numérico.

A cavidade oral é responsável por 90% dos casos de halitose, o trato respiratório é responsável por 8%, o trato gastrointestinal e outras causas diversas são responsáveis por apenas 2%,. Como a boca é a principal fonte de halitose, torna-se essencial uma investigação especializada da cavidade oral/nasal. Infelizmente, nem todo dentista é capaz de fazer uma avaliação completa com relação às diversas causas da halitose. Quando o profissional não está focalizado na doença, algumas informações importantes podem ser perdidas. Algumas afecções mais leves, como por exemplo, gengivite, ou a presença de placa bacteriana, saburra lingual podem não ser detectadas numa avaliação dental não focalizada nas diversas causas da halitose.

Outras Causas

Disfunções renais são geralmente resultados de glomerulonefrites crônicas, as quais danificam a função glomerular, levando a um aumento do nível de uréia no sangue. O ar expirado é caracterizado como hálito de amônia e, geralmente, existe uma queixa associada de disgusia (alteração do paladar).

Diabetes pode resultar no acúmulo de corpos cetônicos, os quais são expirados, produzindo um hálito adocicado muito característico. Além disso, a diabetes pode causar ressecamento da boca, aumentando a descamação celular e, conseqüentemente, aumentando a produção dos compostos sulfurados voláteis. A diabetes e outras situações de resistência à insulina também estão relacionadas com deficiências na secreção de fluidos corpóreos tais como lágrima e saliva, podendo ocorrer, portanto, xerostomia.

Trimetilaminúria ou "síndrome do odor de peixe podre" é uma desordem metabólica genética caracterizada pela falência na rota de oxidação da trimetilamina (TMA) para trimetilamina N-óxido (TMA-O) no fígado. Isso ocorre devido à mutação genética do FMO. Altos níveis de TMA na urina e em outros fluidos corporais e na respiração conferem o típico, desagradável e intermitente odor característico de peixe.

Lesões tumorais em qualquer parte do corpo também podem produzir gases voláteis devido ao processo de necrose. Esses gases são expirados, provocando halitose, e essa é a razão pela qual a halitose pode indicar a presença de doenças graves.

Recentemente, o estudo da halitose foi introduzido em cursos de especialização em escolas de Odontologia.

O otorrinolaringologista é muito importante também na avaliação e tratamento da halitose. Mais uma vez, quando o profissional não está familiarizado com as possíveis causas, algumas informações importantes podem ser perdidas. A sinusite crônica e a tonsilite são as fontes mais comuns de halitose. Novos exames tais como tomografia computadorizada (CT), podem ser úteis na detecção de sinusites que não estão presentes em exames normais de raios-X. A Tonsilite Crônica Caseosa (TCC) está extremamente relacionada com a halitose. A tonsilectomia, embora seja um procedimento cirúrgico comum na rotina otorrinolaringológica, ainda oferece riscos tais como sangramentos, complicações com anestesia, necessidade de internação do paciente, entre outros. Novas técnicas mais conservadoras, tais como a ablação das tonsilas com laser de CO2, possibilitam o tratamento da halitose e podem ser uma alternativa à tonsilectomia.

Atualmente, em virtude dos problemas relacionados à vida moderna, as pessoas não bebem água ou não se alimentam adequadamente. A maioria das pessoas com queixa de halitose não bebe água em quantidade adequada por dia ou até mesmo nem bebe, substituindo-a por refrigerantes, sucos e outros. Isso pode causar uma diminuição do fluxo salivar, um aumento na viscosidade da saliva devido a essa desidratação. E ainda, a rotina de trabalho, os horários apertados não permitem mastigação adequada e que uma boa higienização dos dentes seja feita como deveria. Muitos trabalhadores não têm um horário específico para as refeições, permanecendo em jejum por longos períodos. Além disso, hábitos como fumar e ingerir bebidas alcoólicas podem piorar a halitose. É chamada halitose específica quando existe uma íntima relação entre a substância ingerida ou aspirada e o hálito do indivíduo. Exemplos de substâncias que podem causar halitose específica são: cigarro comum, charutos, cachimbos, álcool, maconha, alho, cebola, café e outras. Algumas dessas substâncias podem causar xerostomia como efeito colateral, como a maconha, por exemplo. Fumantes, em geral, podem ter suas línguas transformadas em língua pilosa devido à atrofia das papilas causada pelo fumo. Essas papilas podem reter mais partículas de alimentos e restos de células epiteliais descamadas aumentadas pela xerostomia causada pelo fumo. As bebidas alcoólicas causam halitose específica por produzirem compostos voláteis após serem metabolizadas. Normalmente, esse tipo de halitose ocorre após alguns minutos ou horas após a ingestão. O álcool também pode alterar a flora intestinal, produzindo halitose devido à sua fermentação. Outros exemplos de alimentos que podem causar halitose específica são o alho e a cebola quando ingeridos em excesso.

Ao se deparar com uma halitose verdadeira, uma avaliação da dieta também se torna essencial. A avaliação de uma nutricionista torna-se necessária com uma re-educação alimentar do paciente.

Gastroenterologistas também contribuem na avaliação dos pacientes com queixa de halitose, pois doenças do fígado, estômago, esôfago, mesmo em menor porcentagem, podem estar envolvidas. Sabe-se que alguns casos da doença do refluxo gastroesofágico e de hérnia de hiato podem contribuir para a presença da halitose.

A cirrose hepática afeta o metabolismo de proteínas. As proteínas animais são decompostas no fígado, e alguns metabólitos, amônia, por exemplo, podem causar halitose. Diabetes pode contribuir para cetose, e um hálito característico de maçã podre pode ser detectado em pacientes diabéticos. Pacientes urêmicos também têm um odor característico, pois a amônia está presente em altos níveis em vários fluidos corporais. Essas causas de halitose são mais raras, porém muito importantes, que demandam diagnóstico e tratamento adequados.

Em alguns pacientes faz-se necessária uma avaliação do sistema respiratório, pois, às vezes, pequenos objetos aspirados podem ficar alojados, levando à formação de abscessos, provocando mau hálito. Outras afecções pulmonares tais como tuberculose, blastomicose e abscessos fúngicos também contribuem para causar mau hálito devido à presença de substâncias em decomposição.

Na nossa experiência pessoal, a maioria dos casos de halitose pode ser detectada e tratada adequadamente por um Cirurgião-Dentista experiente e por um médico otorrinolaringologista especialista. Em aproximadamente metade dos pacientes, a contribuição de um otorrinolaringologista é essencial. A maioria dos pacientes com queixa de halitose, que procuram primeiramente um gastroenterologista, é submetida a exames de endoscopia desnecessariamente. Embora exista um esforço significativo para correlacionar a infecção por H. pylori e halitose, ainda não há evidências que justifiquem endoscopia de rotina para avaliação da halitose. Por outro lado, a nasofibroscopia feita por um experiente otorrinolaringologista pode trazer maiores contribuições na avaliação e tratamento da halitose.

Às vezes, a avaliação de um clínico geral torna-se indispensável quando é necessária a investigação de causas mais raras de halitose. Doenças raras podem ter seu diagnóstico feito, iniciado com a investigação da queixa de halitose.

É fundamental que Cirugiões Dentistas, Otorrinolaringologistas, Gastroenterologistas, Nutricionistas e Psicólogos trabalhem em conjunto. O uso do halímetro como um teste objetivo de rotina na avaliação, diagnóstico e tratamento da halitose. Cada profissional especialista realiza testes específicos relacionados com a própria área de atuação quando julgam essenciais. Sendo assim, não há exames desnecessários, e praticamente todos os pacientes têm um diagnóstico após o protocolo de avaliação. Seguindo essa metodologia se obtem uma alta porcentagem de pacientes satisfeitos com os resultados do tratamento.

Para finalizar, deve-se levar sempre em consideração que o paciente que sofre de halitose é uma pessoa que procura por ajuda, geralmente com ansiedade e suspeitando de qualquer tratamento, em virtude das experiências prévias de tratamentos malsucedidos. Avaliação da dieta, orientação de higienização oral são essenciais no que diz respeito ao tratamento da halitose além do aconselhamento psicológico quando for necessário. A halitose deve ser tratada com seriedade, e uma abordagem multifatorial e racional é essencial para a obtenção de bons resultados. Sua presença pode ser indício de patologias sistêmicas graves. Além disso, há gastos importantes em consultas ambulatoriais, avaliações de especialistas, exames subsidiários e uso de substâncias mascaradoras do hálito. Tais gastos poderiam ser minimizados, adotando-se uma anamnese baseada em evidências e um fluxograma de investigação clínica.

A.A Cruvinel,A.R.

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Autora

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Dra. Aila Cruvinel

Ortodontista e Ortopedista dos Maxilares

 ,

Cirurgiã Dentista -Especialista em Ortodontia e Ortopedia Funcional dos Maxilares.

Pós-Graduada em Odontologia Estética e Estudos das Alterações do Hálito.

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