Diabetes Mellitus, Qual a Melhor Conduta Odontológica?

  Artigo, 24 de Jun de 2014

Caracterizado por hiperglicemia crônica, com distúrbio do metabolismo dos carboidratos, lipídios e proteínas, o Diabetes Mellitus (DM) é conceituado como uma síndrome de etiologia múltipla, decorrente da ausência de insulina parcial ou total e/ou da incapacidade deste hormônio de exercer adequadamente seus efeitos. Atualmente, o DM é classificado em dois tipos principais, denominados tipo 1 (DM1), que apresenta dois picos de incidência que ocorrem entre 5-7 anos de idade e na puberdade, acometendo de 5 a 10% dos pacientes com DM, sem predileção por gênero; e o tipo 2 (DM2) que é a forma mais comum da doença, responsável por 90-95% dos casos, acometendo principalmente indivíduos com mais de 40 anos. Outras formas menos comuns são o Diabetes gestacional, Diabetes associados a medicamentos, doenças do pâncreas, infecções e síndromes genéticas.

A tríade sintomática – polidipsia, a polifagia e a poliúria - são os principais sintomas do DM, resultado da deficiência da insulina. Seiffert, em 1862, descreveu as alterações patológicas na cavidade bucal associadas ao DM, podendo incluir gengivite, doença periodontal, disfunção da glândula salivar (xerostomia), suscetibilidade para infecções bucais, síndrome de ardência bucal e alteração do paladar.

Manifestações Bucais

Os portadores de DM podem apresentar gengivite, doença periodontal, disfunção da glândula salivar (xerostomia), suscetibilidade para infecções bucais, síndrome de ardência bucal e alteração do paladar. Os distúrbios periodontais são os mais frequentes devido à resistência reduzida à infecção, que uma vez instalada, torna-se mais grave neste tipo de enfermo. O risco de doença periodontal é aproximadamente três vezes maior nos portadores de DM2. No portador de DM1, que não mantém um rigoroso controle glicêmico, a doença periodontal é mais extensa e severa. A xerostomia acomete entre 40 a 60% dos portadores de DM, apresentando como consequências mais comuns secura, atrofia e feridas na mucosa bucal, mucosites, úlceras e descamações, assim como infecções bacterianas oportunistas e fúngicas, inflamação e a despapilação da língua. Esta disfunção da glândula salivar ocasiona dificuldades de mastigação, de ingestão alimentar e alteração no paladar que podem contribuir para o prejuízo nutricional. A Síndrome da Ardência Bucal envolve dor ou sensação de ardência que podem ser intensas. Normalmente não se identificam lesões. A causa da síndrome de ardência bucal não é clara, mas pode estar relacionada à disfunção da glândula salivar, candidíase, ou alterações neurológicas como depressão. O portador de DM pode apresentar alteração da microbiota bucal com tendência à candidíase bucal e queilite angular. Com menos frequência, há a ocorrência de tumefação da glândula parótida, abscessos recorrentes, hipoplasias e hipocalcificação dentária.

Conduta Profissional

Compete ao cirurgião-dentista obter maior conhecimento sobre essa patologia e suas manifestações bucais, tendo um papel fundamental na identificação de DM em pacientes que apresentam os sinais e sintomas desta doença. Pacientes que apresentam história positiva devem ser encaminhados a um laboratório de análise clínica ou ao médico, para uma avaliação adicional, antes de ser iniciado o tratamento odontológico. O diagnóstico, tratamento e controle dos pacientes portadores de DM requerem um conhecimento detalhado do processo da patologia. Contudo, nota-se a falta de informação dos profissionais quanto à forma mais adequada de lidar com este tipo de paciente. Diante disso, ao investigar a história clínica do paciente, o Cirurgião Dentista deve incluir perguntas que remetam para a tríade sintomática do DM, assim como para a perda de peso e os níveis recentes de glicose. O paciente que sabe ser portador de Diabetes deve informar: a classificação (tipo); a terapia que está sendo utilizada; o nível de controle metabólico e a presença de complicações secundárias da doença. O mesmo deve ser questionado especificamente sobre a duração da doença, a ocorrência de hipoglicemias, a história de hospitalizações e modificações no regime terapêutico.

As dosagens e o tempo de administração da medicação devem ser determinados, pois uma variedade de medicações pode alterar o controle de glicemia, pela interferência na ação da insulina ou no metabolismo dos carboidratos. A ação hipoglicemiante das sulfoniuréias pode ser potencializada pelas drogas de alto teor de proteínas como os salicilatos, dicumerol, bloquedados ß-adrenérgicos, inibidores de monoamina oxidase, sulfonamidas e inibidores da enzima conversora da angiotensina. A epinefrina, os corticosteroides, os tiazídicos, os contraceptivos bucais e os bloqueadores dos canais de cálcio podem causar hiperglicemia. As consultas de pacientes portadores de DM devem ser curtas e no início da manhã, uma vez que os níveis endógenos de corticosteroides neste período são geralmente altos, portanto os procedimentos estressantes podem ser mais bem tolerados. No caso de uma consulta demorada, especialmente se prolongar pelo tempo da refeição normal, deve-se interromper o atendimento para uma refeição rápida. Ressalta-se que o paciente deve manter a sua dieta e terapêutica normais antes da consulta.

O uso de antibióticos para pacientes com bom controle glicêmico é semelhante ao de não-diabéticos, ou seja, só deve ser realizada quando existirem sinais e sintomas sistêmicos de infecção. Nos pacientes com doença mal controlada, mesmo na ausência de sinais e infecção, preconiza-se profilaxia antibiótica nos procedimentos que geram bacteremia importante. O uso profilático de antibióticos no pré e no pós-operatório deve ser considerado para diminuir os riscos de infecção. Além disso, a pressão arterial deve ser monitorada, visto que pacientes diabéticos possuem um maior risco de desenvolverem hipertensão. Na prescrição curativa podem ser usados: penicilinas (amoxicilina, ampicilina), cefalosporinas (cefalexina) ou macrolídeos (azitromicina, claritromicina). Não devem ser prescritos antibióticos sob a forma de suspensão bucal que contém glicose na sua composição, pois podem a agravar a hiperglicemia. Os antibióticos, analgésicos ou anti-inflamatórios de escolha são os metabolizados pelo fígado. Os anti-inflamatórios não-esteroidais (AINES) devem ser usados com cautela, porque podem promover retenção de sódio e água e provocar sangramento gástrico.

Em caso de choque glicêmico no consultório, o profissional deve estar atento aos sintomas adrenérgicos como desmaio, fraqueza, palidez, suor frio e os sintomas neuroglicopênicos como visão turva, diplopia, sonolência, dor de cabeça, confusão mental, entre outros. Diante dessa condição, deve-se administrar uma bebida com alto teor de carboidratos, colocando o paciente sob observação até que todos os sinais e sintomas tenham desaparecidos. Caso o estado de hipoglicemia seja persistente, o paciente pode se tornar inconsciente. Os pacientes hiperglicêmicos com glicemia superior a 400mg/dL podem apresentar sinais e sintomas característicos de cetoacidose metabólica, como a presença de hálito cetônico, náuseas, vômitos. Neste caso, podem ser administradas pequenas doses de insulina, e encaminhados para o médico. Os diabéticos compensados podem ser considerados pacientes normais para tratamento odontológico. No entanto, quando apresentarem concentração de glicose no sangue acima de 200mg/dL, só podem sofrer intervenção cirúrgica com acompanhamento médico.

Com relação ao uso de anestésicos locais, a lidocaína não é a melhor escolha, por ser considerado um anestésico de curta duração. Os anestésicos de longa duração também não são de melhor escolha, porque têm influência no miocárdio. Os anestésicos mais indicados são aqueles cujos componentes contenham prilocaína e felipressina. A anestesia de bloqueio deve ser preferida, evitando-se o uso de soluções que contenham vasoconstrictor à base de adrenalina, pois esta promove a quebra de glicogênio em glicose, podendo determinar hiperglicemias. Entre as principais complicações bucais entre pacientes portadores do DM têm-se a xerostomia (controle glicêmico, estimulantes da saliva), síndrome da ardência bucal, infecção recorrente por herpes simples (Aciclovir uso tópico 5x ao dia ou oral 200mg durante 5-10 dias), infecção por Candida albicans (cetoconazol 50mg 1x ao dia por dez dias ou 150 mg fluconazol 1x ao dia por 10 dias), doença periodontal (raspagem, alisamento radicular, controle de placa, higiene bucal e bochechos com clorexidina) e líquen plano erosivo - corticoide tópico por duas semanas.

Referências

CANTANHEDE, A. L. C; VELOSO, K. M. M; SERRA, L. L. L. O idoso portador de diabetes mellitus sob a perspectiva odontológica. Revista Brasileira Clínica Médica. São Paulo, 2013; 11(2): 178-182.

YARID, S. D; GARBIN, C. A. S; GARBIN, A. J. I; FRANCISCO, K. M. S; SUMIDA, D. H. Conduta odontológica no atendimento a portadores de diabetes mellitus. Revista Saúde. Com. 2010; 6 (1): 74-85.

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Autor

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Dr. Diogo Crateus

Cirurgião-Dentista

 Recife, PE

Possui graduação em Odontologia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE, aperfeiçoamento em Ortodontia pelo o Sindicato dos Odontologistas no Estado de Pernambuco -... Leia mais

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